28.6.08

Partes para usar depois

Escrevo um poema em que a maresia corrói o rosto das pessoas. Um sobre uma cidade grávida do verão. Outro, sobre uma cidade que desaparece e alguém que aprende a desaparecer junto – o amor um prédio que implode ao contrário e vai para os céus, de repente transformado numa nave espacial.

25.6.08

não fale
desse
meu
esganiçado
empedernido
alucinado
coração

ou de
todas as
histórias que
não são
minhas
mas que
eu uso
mesmo
assim

esses
samplers
que me
contam
de viés

21.6.08

extras

quando estou
vagando pelas
ruas e sinto
o cheiro de
maresia ou
ouço a voz do
mar ecoando nas
dobras de uma
concha começo
a tremer meus
olhos se fecham
e posso até sentir
o vento sul
cortante do
meu próprio
espírito santo
particular
quando
o scotty que
eu tanto
queria beijar
se apaixona por
uma tal italiana
eu tremo fecho
os olhos e penso
no meu próprio
espírito santo
particular
que deixei
à tanto
naquela estrada
à beira-mar
só de pensar
no meu próprio
espírito santo
particular
meus nervos
reagem se
descontrolam a
rodovia do sol
que eu
experimentei e
que parece
o rosto desfigurado
que chamo
de lar e
que deve dar
em todo
todo o
mundo

19.6.08

"O problema de escrever: o escritor, como diz Proust, inventa na língua uma nova língua, uma língua de algum modo estrangeira. Ele traz à luz novas potências gramaticais ou sintáticas. Arrasta a língua para fora de seus sulcos costumeiros, leva-a a delirar. Mas o problema de escrever é também inseparável de um problema de ver e de ouvir: com efeito, quando se cria uma outra língua no interior da língua, a linguagem inteira tende para um limite 'assintático', 'agramatical', ou que se comunica com seu próprio fora.
O limite não se está fora da linguagem, ele é o seu fora: é feito de visões e audições não-linguageiras, mas que só a linguagem torna possíveis. Por isso há uma pintura e uma música próprias da escrita, como efeitos de cores e de sonoridades que se elevam em cima das palavras. É através das palavras, que se vê e ouve. Beckett falava em 'perfurar buracos' na linguagem para ver ou ouvir 'o que está escondido atrás'. De cada escritor é preciso dizer: é um vidente, um ouvidor, 'mal visto mal dito', é um colorista, um músico".

Deleuze,
Crítica e Clínica.

5.6.08

me irrita que de novo
perca tudo com a cabeça
enfiada dentro do
livro, o centro do Rio aos poucos
se afastando e o de Niterói
que se aproxima

do deque penso o tempo todo na
barca virando, caindo
lentamente em direção
ao mar – tão escuro
e espesso – e
na falta de coletes salva-vidas
por perto

também naquela história de Camões
naufrago, salvando as Lusíadas
e deixando seus companheiros à
morte em Macau

mas é tudo o mesmo
movimento sacolejante entre
duas cidades.
isso de mar e
morte, poesia e
paranóia. a distância que
nos separa dos dois
pontos. a importância
do que está no
meio.
 

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