28.11.10

no meio das estrelas,
de onde posso enxergar
todo o intenso fluxo
de corpos celestes
tão perdidos
quanto eu,
a solidão é
de tal forma
ubíqua
que até me esqueço
dela, só flutuo
lentamente
dentro de sua matéria
negra (e, se penso
bem, nem posso
dizer de velocidade quando
a vastidão é eterna).
não poderia explicar
porque sobrevivi
à explosão de nossa
nave espacial.
sei
que estou vivo
e tenho um corpo
que é como
um meteorito, esperando
pacientemente
a hora de se chocar contra
uma superfície
(qualquer uma)
até lá eu
não toco mais em
nada
que não seja vácuo,
que, de toda forma,
não é algo a ser
tocado.
penso, penso, penso,
infinitamente
e quase posso sentir
tudo se esgarçando
à minha volta.
nada pode ser tão real
quanto isso:
estar só,
      estar vivo,
           estar exatamente aqui onde estou,
sustentado
unicamente
pelos meus pensamentos
um minuto ou
um milênio
antes de enlouquecer

(inspirado por uma obra da
Laurie Anderson e, portanto,
pelo Anderson)

21.9.10

Uma ou outra coisa.

O mar, por exemplo. Ainda que nem sempre eu vá de fato ao seu encontro. É algo que muitos dizem, é um clichê de quem mora em lugar de praia, de quem sempre morou. Tem um poema da Mara que diz mais ou menos essas coisas, cavar e encontrar água em qualquer lugar em que a gente estiver.

Andar à noite na ponte de Guarapari voltando pra casa, bêbado. O mar é uma substância espessa rebrilhando a cidade da qual eu passei tanto tempo fugindo.

E o verão. A minha estação super favorita do ano. As noites de verão. Porque eu nasci num lugar que só faz sentido no verão – em que há duas estações: os três meses de felicidade prometida e os outros nove de invernada, em que não há ninguém na rua depois das oito e você pode ir ao calçadão numa tarde de terça-feira e não há quase ninguém lá, a não ser uns velhinhos caminhando.

Aí no verão você quase não consegue andar no calçadão.

São coisas que eu acho importantes, o mar e o verão. Mesmo que façam 43 graus no Rio de Janeiro e que eu quase nunca vá à praia.

Mas faz um tempo que eu não volto ao Espírito Santo.

Talvez seja só saudade.

17.8.10

faces da morte

uma das coisas que
ainda me surpreende
é que consigamos
reconhecer as pessoas
de nossa infância
tantos anos depois
mesmo que suas feições tenham
se diluído ou
se concentrado
mesmo que seus rostos
tenham se alongado ou
que seus tecidos tenham
Inchado de forma
considerável
que sejam iguais –
o mesmo rosto de criança –
ou tenham mudado
completamente –
doença, sofrimentos,
cirurgia plástica.

aposto que se existisse céu ou
inferno,
neles também nos
reconheceríamos
não pela alma nem
nada
e sim pelo particular modo
de andar entre as nuvens
ou pelo mapa da
constelação
formada pelos nossos
narizes bocas orelhas olhos

mas
tais lugares não existem
e daqui a um tempo
ninguém nos reconhecerá
mais
nossa constelação será feita
de ossos escondidos
em gavetas e poeira
aspergida
pelo mundo

20.07.2010
CTAv

***
O meu modo próprio de me inspirar a escrever poemas pode ser muito bem identificado como pura e simples cópia.
Ler outros autores me inspira: seus universos e ritmos particulares. É sempre um mergulho neles que me leva adiante com a poesia e a literatura em geral. Mas aí a literatura é subproduto, eu sei: são maus poemas, maus contos.
Isso pra dizer que esse poema é inspirado (chupado, copiado, etc.) da Adília Lopes.

***
Nota adicionada um tempo depois (16.08.10):

Você lê um poema demais – um poema que seja seu pelo menos – e de repente nada nele tem nenhum significado. Nada nele é verdade, tudo é idiota. Nem o filete de sangue resta pra nos lembrar o porquê de escrevê-lo.

24.6.10

dos poemas esquecidos no caderno verde:

suicida


não há traquejo
que baste (na verdade
não há nenhum)
quando você se torna
kamikaze quando
você mergulha
no ar frio
da noite
naquele exato
momento
os flertes nos
bares aeroportos
nas festas de rock
quando você fecha
os olhos respira
fundo
e

7.5.10

barão geraldo

o ônibus se enche
aos poucos com
as vozes
outras vidas se
interpelam sem
rosto preenchem
a urgência
moldura vermelha
do caderno.
no terminal meio
abandonado e
vazio
na maior rodoviária
da américa latina
em qualquer
lugar: a profissão
de escutar
e depois
embaralhar as palavras
na névoa.
histórias
eternamente
abertas e
que não
esperam mais
nada
somos nós
que esperamos
agarramos a mochila
no colo com força
ouvimos tudo
aquilo que
podemos e voltamos
para casa.
 

Hit Counters

eXTReMe Tracker